Por que os negros abandonam os terreiros?


Nos últimos meses tivemos diversas notícias policiais envolvendo a intolerância religiosa. A destruição de imagens em um terreiro por membros de uma igreja pentecostal, a repressão ao uso de guias e roupas brancas em uma escola, ameaçam incluir o Rio de Janeiro no rol das cidades onde persiste a alimentação do ódio em detrimento da fé.



Não é de hoje que o fantasma da intolerância anda atormentando a cultura brasileira e ameaçando as religiões de matriz africana. Quando frequentei na juventude essas igrejas evangélicas fui estimulado a abandonar minhas raízes culturais e negar a fé nos Pretos Velhos, Caboclos e nos Orixás. Fui até proibido de aceitar saquinhos de doces, e negar a minha mediunidade. Nos encontros coletivos que participei os pastores afirmavam aos berros que cultuando espíritos malfazejos eu estaria promovendo culto à Satanás e tenderia embarcar em um caminho sem volta.


Ao negar essas bobagens, dei o primeiro passo no Caminho da Verdadeira Espiritualidade. Como negro, aprendi – entre outras coisas – algo muito importante para quem deseja se estabelecer dentro da vida social: Respeito. Sabe por quê? Se você não respeitar e valorizar sua cultura, suas raízes, sua origem, sua história, jamais se estabelecerá como cidadão. Isso é uma lógica. A base de qualquer relacionamento é o Respeito – a começar o respeito por si mesmo. Basta saber que ninguém que diz amar a Deus poderá odiar a sua origem, sua história, suas raízes e depois sair por aí reclamando de injustiça social e preconceito. Isso é ignorância. Nenhum povo renega sua cultura - vide o exemplo dos judeus, ciganos e os povos de origem oriental.



Uma coisa muito curiosa aconteceu meses atrás. Fui convidado por um amigo (branco) filho-de-santo, para assistir um culto de umbanda, em Vila Isabel, zona norte do Rio de Janeiro. Ao chegarmos, reparei que na assistência a maioria era composta de pessoas brancas (as únicas exceções eram três mulatas, dois homens pardos, um jovem moreno claro e um negro – eu). No terreiro, uns dez médiuns relativamente brancos e uma negra (uma senhora de idade avançada que parecia ser a fundadora) cantavam e acompanhavam os atabaques ao som de palmas. Não comentei nada com meu amigo, mas em silêncio registrei essa curiosidade: um lugar onde basicamente proliferavam os negros, hoje era praticamente exclusivo às pessoas de pele branca! Era um paradoxo social. O que estaria acontecendo? Por que os negros estariam se debandado dos terreiros?

VIVENDO PARADOXOS SOCIAIS

Conheço diversos judeus umbandistas que rodopiam de branco, recebem santos e dão consultas, envolvidos em guias multicoloridas. O problema é que aqui em todo Brasil os conflitos de fé desenvolvem em torno de uma luta por poder político. As igrejas pentecostais incorporaram a lógica do “mercado religioso” e uma racionalidade pragmática, do tipo empresarial. Elas pregam a valorização da felicidade do “aqui e agora” a partir da prosperidade financeira, da boa saúde e do sucesso profissional. Ser negro, pobre, favelado e macumbeiro é o maior dos pecados pelos pentecostais. Por isso, esses grupos religiosos se impõem, sofisticam estratégias, espalham sua presença por vários setores, acumulam prestigio e força política nas favelas e nos presídios – lugares que o número de negros e mulatos é assustadoramente maior. Certamente os doutores em antropologia já perceberam isso há muito tempo.


A RELIGIÃO NÃO É UM FIM - É UM COMEÇO


Há fiéis que fazem de sua religião um fim. Infelizmente, esquecem que religar a Deus é um começo. Até o surgimento do cristianismo, as religiões se prendiam a limites étnicos, culturais e territoriais. O apóstolo Paulo universalizou a proposta de Jesus, estendeu o cristianismo a todos os povos sem precisarem renunciar a suas identidades culturais. Pena que aos seguidores dessas igrejas não possuem a percepção espiritualista para entender isso. Quem pratica os ritos da sua religião, acata os mandamentos, paga o dízimo, mas é intolerante com quem não pensa ou crê como ele, pode ser um ótimo religioso, mas carece de espiritualidade. Ser Espiritualista não significa pertencer a uma Religião específica. Há quem passe uma vida inteira seguindo ou trocando de religião sem nunca conseguir se espiritualizar.

Ser Espiritualista é assumir o dever de procurar dimensionar e viver uma nova situação social mais humana e progressista, que leve o planeta a uma melhor condição de vida.



Ser Espiritualista é ser justo e perfeito na condução desse dever, procurando estar o tempo todo voltado para a lapidação interior e para o melhor aperfeiçoamento do cidadão universal.

Ser Espiritualista deixar-se absorver. É ser honesto. É ser sincero. É ser fiel. É ser justo. Por isso quando você disser da próxima vez que é um religioso espiritualista lembre-se que isso significa muita coisa. Ser Espiritualista envolve, além das quatro qualidades acima, uma condição espiritual e uma postura filosófica aonde ainda somam-se a Amizade, a Tolerância, a Humildade, a Compreensão e a Educação. Esses nove ingredientes juntos, misturados em proporção adequada são capazes de formar uma couraça poderosa para qualquer um. Torna-se um cidadão sustentável.



O verdadeiro Espiritualista é um ser humano especial, pois diferenciado das outras pessoas ele tem a obrigação de melhorar e modificar a sociedade através dos bons exemplos.

O verdadeiro Espiritualista é virtuoso e obstinado em sua missão de melhorar o mundo e não deve nunca, por convicção, desistir ou se afastar desse objetivo.

O Espiritualista deseja algo mais do que alcançar um lugar no céu. A Espiritualidade, como já mencionado, é uma condição espírito-filosófica, onde a pureza da alma e a correção das atitudes são condições primordiais para melhorar o mundo.

Após a leitura desse texto, reflita sobre a sua conduta espiritual. O que você está sendo nesse momento? Um Espiritualista em ação ou um religioso egoísta que se distancia das realidades do mundo desejoso apenas de felicidade pessoal, prosperidade e sucesso profissional?

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